Josi Benegate dá aulas em duas Etecs e conta com uma extensa lista de diplomas pode representar um passaporte para mudar realidade de escassez e poucas perspectivas
Educadora defende importância de datas, como Dia da Consciência Negra, para trazer discussões e mudanças | Foto: Divulgação
Mudar a realidade por meio do estudo é tarefa árdua. E foi essa a tarefa a que se propôs Josi Benegate, professora das Escolas Técnicas Estaduais (Etecs) Carlos de Campos e Itaquera II, da Capital. “Hoje é mais fácil, há mais Institutos Federais, você pode contar com bolsas de estudos”, conta a docente, que deixou a pequena cidade de Floriano, no Piauí, e rumou para São Paulo, aos 19 anos.
Com o diploma de uma Escola Técnica Federal, que cursou com dificuldades em sua cidade Natal, a professora descobriu as Etecs. “Foi a minha salvação”, conta. “Era ensino de qualidade e gratuito”, lembra. Na Etec Carlos de Campos, onde hoje dá aulas, concluiu o curso técnico em Design de Interiores; na Etec Guaracy Silveira, o curso técnico em Design de Móveis.
As primeiras graduações viriam a seguir – Tecnologia em Design de Interiores e Arquitetura. Em seguida, pós-graduação em Arquitetura Comercial, Lighting Design e Neuroarquitetura. E ainda uma licenciatura em Artes, antes que a professora desse início ao doutorado na Escola de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de São Paulo (USP).
Harmonizar cores
“No doutorado, proponho uma metodologia que ajude os arquitetos a usar cor nos interiores, o que não é usual no Brasil”, diz, creditando o excesso de tons neutros à falta de conhecimento sobre como harmonizar cores.
Todo o estudo vem lado a lado com muito trabalho. No começo, atuava como estilista na rua São Caetano, conhecida como rua das noivas, no centro da Capital. Hoje, além da docência, mantém um escritório em que exerce trabalhos na área de design de interiores, como especialista em iluminação. “Sou um tipo diferente de acadêmica, gosto de estar no mercado de trabalho atenta às mudanças e atualizações”, acredita.
Para uma mulher negra e transexual, mesmo uma carreira tão brilhante não se desenrola sem entraves, dificuldades e decepções. “Em muitos espaços o currículo é avaliado depois de cor, beleza e padrão”, reflete. Em 2023, decidiu fazer transição de gênero, consciente das dificuldades, mas sem medo delas. “Vou fazer a transição aos poucos, sem pressa. Não quero que tire a minha concentração no doutorado”
Diversidade e gênero
A docente avalia de forma positiva a existência de um Dia da Consciência Negra. “Acho muito importante”, diz. “Há dez anos não era possível discutir as mesmas propostas de agora. Não dá mais para disfarçar, o racista será chamado de racista e as outras pessoas talvez sejam minimamente sensibilizadas”.
Em 2023, a professora foi convidada a apresentar uma palestra no Fórum Diversidade e Gênero – um olhar humanizado nas unidades de ensino da Gestão Participativa, organizado pelo Centro Paula Souza (CPS), em agosto de 2023, ao lado de outros três palestrantes. “Fiquei honrada”, lembra. “Ao promover um evento como esse, o CPS abre um grande portal de respeito com o próximo”. Para ela, em todo o Brasil, essas comemorações e datas têm feito diferença, como os movimentos que trazem a questão histórica da escravidão e seus ecos até os dias de hoje. “Por que estamos nesse lugar? Por que temos que estudar três, cinco vezes mais para disputar os mesmos espaços?”
Para o futuro, a professora Josi pensa em… mais estudo. Daqui a um ano, quando terminar o doutorado, virá o pós-doutorado. Não planeja férias. “Visito a família no Piauí e sou professora convidada em mais de 20 universidades brasileiras para falar sobre os assuntos em que tenho expertise”, conta. “Vida e trabalho, para mim, são uma coisa só”.