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No mês da Consciência Negra, professor celebra Zumbi dos Palmares

Historiador Marcelo de Paiva traça um panorama dos acontecimentos que tornaram o 20 de novembro um feriado nacional – sai a princesa Isabel, entra Zumbi, morto em 1695

20 de novembro de 2024 8:00 am Etec, Eventos, Fatec, Institucional

Memória de Zumbi dos Palmares marca homenagem ao dia 20 de novembro, feriado nacional a partir de 2024 | Foto: Divulgação

Quimbundo ou kilombo, a expressão de origem Bantu, língua falada na região onde hoje está localizada a República de Angola, significa acampamento. Durante os períodos colonial e imperial, escravizados fugidos se reuniam em comunidades chamadas quilombos, como o grupo da Serra da Barriga, o maior do Brasil.

A mata fechada abrigava o quilombo dos Palmares, uma comunidade com cerca de 20 mil escravos, além de indígenas e pessoas livres, que resistiram ao longo do século 17 às várias investidas da administração colonial portuguesa. O quilombo caiu sob o cerco do bandeirante Domingos Jorge Velho. Conhecido como Zumbi, o líder da resistência foi preso e morto no dia 20 de novembro de 1695.

Por volta de 300 anos depois, a partir da turbulenta década de 1970, lideranças intelectuais do movimento negro, como Oliveira Ferreira da Silveira, do Grupo Palmares, e Abdias do Nascimento, do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (Ipeafro) escolheram homenagear Zumbi como símbolo de resistência, papel que não cabia à Princesa Isabel, regente que assinou a Lei Áurea.

Formação da sociedade brasileira

O historiador Marcelo de Paiva, professor da Escola Técnica Estadual (Etec) de Tiquatira, da Capital, lembra que o centenário da Abolição da Escravidão, em 1988, foi comemorado com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a ‘Constituição Cidadã’, que pôs fim à Ditadura Militar (1964-1985).

Também em 1988 foi criada a Fundação Cultural Palmares, para promover os valores culturais, sociais e econômicos dos afrodescendentes na formação da sociedade brasileira. Entre suas atribuições está identificar e reconhecer comunidades quilombolas para que sejam demarcadas suas terras.

Hoje há mais de 3 mil comunidades de descendentes de quilombolas com seu direito à terra reconhecido pelo Estado Brasileiro. Outras ainda aguardam a demarcação de seus territórios.

Linha do tempo

As conquistas do movimento negro começaram antes mesmo da Constituição. A própria eleição dos candidatos ligados ao Movimento Negro Unificado, em 1985, é uma delas. Em 1989 foi aprovada a Lei Caó, que criminaliza o racismo. No início dos anos 2000, os ganhos se sucedem de forma um pouco mais acelerada.

Novas leis tornaram obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira, determinando o dia 20 de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra, e tipificaram o crime de trabalho em condição análoga à escravidão, em 2003; regulamentaram os direitos trabalhistas das empregadas domésticas, em 2006; instituíram o Estatuto da Igualdade Racial, em 2010, as cotas sociais, econômicas e raciais no ingresso dos cursos de Ensino Superior, em 2012, e em concursos públicos, em 2014.

Durante a gestão do músico e imortal da Academia Brasileira de Letras Gilberto Gil como ministro da Cultura (2003-2008), diversas referências afrobrasileiras foram reconhecidas como patrimônio cultural brasileiro pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan): o ofício das baianas do acarajé, as matrizes do samba do Rio de Janeiro e a capoeira. Outros órgãos estaduais e municipais de preservação também têm pouco a pouco valorizado referências afrobrasileiras.

Finalmente, em 2011, o dia 20 de novembro se tornou, oficialmente, o Dia Nacional de Zumbi dos Palmares e Consciência Negra; em 2023, quando alguns estados já tinham tornado feriado o 20 de novembro, o congresso estendeu o feriado a todo o País. Assim, 2024 é o primeiro ano em que a data será comemorada como um feriado nacional.

Intelectuais na vanguarda

O Brasil começa a recuperar seus intelectuais negros, como Sueli Carneiro e Lélia González (1935-1994), que chamava nosso idioma de ‘pretoguês’ por ter a influência da musicalidade e do vocabulário africanos.

Em O Quilombismo, Abdias do Nascimento (1914-2011) defendia que os quilombos eram modelos de organização social e política a serem seguidos no País por terem uma estrutura comunitária, propriedade coletiva da terra e por preservarem as condições ambientais equilibradas para todas as criaturas.

Para a pedagoga Azoilda Loretto da Trindade (1957-2015), a nossa cultura é permeada de valores civilizacionais de origem africana: na oralidade, na prática de rodas, na corporalidade, na musicalidade, na ludicidade e na cooperatividade. Perceber essas heranças culturais, portanto, é nos reconhecer como povo afrodescendente.

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