A seleção de depoimentos e experiências de alguns professores de Etecs e Fatecs visa estender a homenagem aos profissionais que contribuem para o ensino de qualidade oferecido pela instituição
O coordenador do curso de Jogos Digitais da Fatec Carapicuíba, Carlos Alberto Paiva, com alunos graduandos | Foto: Divulgação
Cerca de 15 mil professores das Escolas Técnicas (Etecs) e Faculdades de Tecnologia (Fatecs) estaduais trabalham em todo o Estado para levar ensino de qualidade a 297 mil alunos. Neste dia 15, o Centro Paula Souza (CPS) agradece a esses educadores pelo trabalho competente e dedicado que realizam. Sem eles, a instituição não seria a referência em formação profissional que é hoje.
O perfil dos profissionais que atuam no CPS é heterogêneo – há especialistas que dominam mecânica industrial ao lado de outros que falam a linguagem dos jogos digitais, por exemplo. Em comum, eles têm a busca constante pela atualização para que se mantenham conectados às demandas do mercado.
Selecionamos uma pequena amostra de histórias de alguns educadores para estender a homenagem a esse time que tanto orgulho dá ao Centro Paula Souza.
Alquimia na escola e na vida
Os professores Gislaine e Sérgio Delbianco costumam dizer que moram na Etec Trajano Camargo e passeiam em casa. Eles se conheceram na faculdade, se casaram e ingressaram juntos na escola de Limeira em 1986 para implantar o curso técnico de Química da unidade.
Gislaine é a responsável pela teoria, enquanto Sérgio fica com as práticas laboratoriais. Em parceria, eles se propõem um desafio audacioso: fazer com que os alunos se interessem pela pesquisa científica e entendam que a química faz parte do dia a dia. Para provar que essa disciplina é menos assustadora do que parece, a professora lembra que 90% dos processos para produção de alimentos são químicos. Outro exemplo, que ela costuma usar para mostrar aos alunos como a disciplina está viva e se transforma, é o surgimento do conceito de Química Verde – especialidade que se dedica à redução do impacto ambiental da indústria, transformando processos tradicionais em sustentáveis.
Depois de 33 anos, os resultados da Etec de Limeira vêm mostrando que a ideia de estimular a pesquisa deu certo. Desde que a metodologia de projetos foi adotada na unidade, em 2006, foram 26 trabalhos apresentados em congressos, feiras e simpósios e cerca de 45 prêmios. “A maioria dos alunos dá continuidade aos projetos quando vai para a universidade”, afirma Gisele. “Depois de formados, eles fazem a diferença no mercado porque começaram a entender a pesquisa ainda dentro da Etec.”
Os professores atribuem o desempenho dos alunos também ao trabalho de equipe na Trajano Camargo, que envolve professores de várias disciplinas. Há projetos interdisciplinares, como o Ciência Cidadã, que reúne turmas dos cursos técnicos de Química e Eventos integrados ao Médio, em parceria com uma escola municipal.
Um dia no museu
Outra história inspiradora mostra como os projetos podem engajar alunos e torná-los mais comprometidos com os estudos. A professora de língua portuguesa Valeria Silva, da Etec Jardim Ângela, localizada na zona sul da Capital, criou o Vanguardas e Modernismo para a turma do terceiro ano do Ensino Técnico Integrado ao Médio (Etim). A proposta era estudar como o movimento modernista influenciou as escolas literárias e proporcionar aos alunos atividades mais interativas, como uma visita à Pinacoteca.
Para Valeria, o resultado foi gratificante porque muitos alunos nunca tinham visitado um museu e, pela primeira vez, puderam apreciar obras que estavam sendo estudadas na escola. Para conseguir o máximo de atenção do grupo de adolescentes, a professora criou um roteiro interativo, uma espécie de caça ao tesouro.
Depois de terem estudado as obras de artistas do Modernismo, os estudantes receberam um mapa com pistas sobre os autores e movimentos artísticos para encontrar os respectivos trabalhos dentro do museu. A proposta deixou a visita mais divertida e permitiu aos jovens testarem o conhecimento sobre o conteúdo das aulas. A reação foi tão positiva que eles postaram suas experiências em redes sociais, com selfies tiradas junto às obras e comentários sobre o projeto.
Logo os estudantes sugeriram à professora a realização de uma semana de arte na Etec. Com a montagem de uma exposição de telas feitas pelos próprios alunos, o projeto mostrou que novas práticas são bem-vindas. “Gosto muito de inventar novas maneiras de ensinar o mesmo conteúdo porque consigo trazer a turma para produzir e aprender comigo”, afirma Valeria.
A matemática em jogo
Práticas inovadoras e criativas também podem ser eficientes para superar o estigma da matemática. Esse é o método que o professor Fábio Aparecido desenvolve com os alunos da Etec Cônego José Bento, de Jacareí, utilizando projetos capazes de mostrar como a ciência dos números tem aplicações práticas na vida.
Para diminuir a resistência à disciplina, Aparecido já usou a matemática para desenvolver um foguete com uma garrafa pet, solucionar jogos japoneses e para montar um cubo mágico estimulando o raciocínio lógico. “O objetivo é promover exercícios que despertem o trabalho em equipe e a troca de experiências, inclusive com propostas interdisciplinares que aliem matemática, física, informática, química e geografia”, explica.
A proposta de aproximar a matemática dos alunos extrapolou o ambiente da escola e está no Youtube no canal Explica, professor, com 2,14 mil inscritos. As práticas de Aparecido também vêm sendo compartilhadas na capacitação A matemática pode ser uma disciplina agradável e divertida no Ensino Médio, oferecida a 50 professores da rede estadual.
De acordo com o educador, esse trabalho contribui para aumentar as notas de matemática dos estudantes da da Etec no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Além disso, a unidade já recebeu 27 menções honrosas em duas edições da Olimpíada Brasileira de Matemática (OBM), em 2016 e 2017.
Game é coisa séria
As unidades do CPS têm também professor que ensina enquanto joga games com os alunos. É o caso do coordenador do curso de Jogos Digitais da Fatec Carapicuíba, Carlos Alberto Paiva, que fez duas graduações pela própria Fatec: Jogos Digitais e Análise e Desenvolvimento de Sistemas (ADS). Atualmente, ele cursa o mestrado na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP).
A cada semestre, o professor propõe um projeto para os alunos utilizarem o conteúdos estudados, como arte, programação, roteiro e modelagem digital, para a produção de um jogo. Segundo ele, a atividade permite que os estudantes façam um test-drive do que vão encontrar no mercado de trabalho, além de criar um portfólio da produção de games ao longo do curso. “No último semestre, tivemos a produção de 84 jogos, com a participação de 257 alunos”, conta. “Eu sou tão entusiasmado e apaixonado pelo que faço que costumo dizer que estou formando uma igreja de jogos digitais.”
Batalha de Pokémon na Geografia
O jogo é uma linguagem universal e está sendo usado também pela professora de geografia Brunna D’ Luise na Etec Paulo do Carmo Monteiro, de Caieiras. Para facilitar a compreensão e assimilação de conteúdos, a docente criou um jogo de cartas, inspirado em Pokémon, com personalidades do Brasil e do município de Caieiras abordando temas relacionado à formação da superfície terrestre como terremotos, vulcões, durações e movimentos de massa.
“A ideia do projeto de cards foi trazer a geografia para o dia a dia dos alunos”, conta Brunna. “Eu já tinha notado que eles jogavam o Pokemon Go cartas e no celular também.” O exercício incluiu a produção dos cards pelos próprios alunos, que depois utilizaram as cartas em batalhas e trocas. A educadora observou que nas aulas seguintes a essa atividade, os alunos tinham mais domínio dos conceitos que estavam sendo transmitidos em sala de aula.
Hacktons nas Etecs
As competições podem ser boas ferramentas de aprendizagem, mas funcionam também para estimular o espírito empreendedor e criatividade dos estudantes. O professor Gislayno Monteiro, da Assessoria de Inovação Inova CPS, desenvolve desde 2015 hackthons nas Etecs em parceria com empresas. “O hackthon é uma metodologia ativa que propõe protagonismo aos alunos, apresentando problemas reais para serem solucionados com ferramentas de mercado, como o mapa de persona e o design sprint”, explica.
Os primeiros parceiros do CPS para realização dessas atividades foram Google e Fundação Telefônica Vivo, mas hoje já existem 38 empresas parceiras, entre elas, Gerdau, JP Morgan, Facebook, Dell, Microsoft e Instituto AES. Para Monteiro, a parceria fortalece as corporações, que consideram a maratona uma forma de oxigenar seus processos internos. Para os alunos, é uma chance de aprender como funciona o mercado profissional.
Como filhos
O professor Orlando Homem de Melo conta que, mesmo depois de 13 anos anos dando aulas na Fatec Tatuí, ainda se emociona com a gratidão dos alunos que ao final da aula vêm em sua direção para cumprimentá-lo e agradecê-lo. “Principalmente os alunos mais maduros,” diz.
Outra experiência marcante para o educador é ver os alunos receberem títulos, como a ex-aluna Andressa Macedo, que se tornou doutora em microeletrônica pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “Os alunos são praticamente como filhos, devemos extrair o melhor deles, conhecer seus problemas e procurar orientá-los.”
Anedota
Décio Cardoso da Silva, da Fatec Sorocaba, lembra uma passagem divertida que aconteceu na sala de professores, um espaço que, segundo ele, é um ambiente propício para compartilhar e aprender.
Um de seus colegas estava corrigindo uma pilha de provas e comentou, eufórico, que um aluno acertaria todas as questões da avaliação. Outros professores queriam, então, saber quem era o estudante que havia realizado o sonho de todo educador. Ao procurarem pelo nome, descobriram que aquele era o gabarito da prova.